TELEMEDICINA, A RESOLUÇÃO 2.314/2022 DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA E A LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS – LGPD

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TELEMEDICINA, A RESOLUÇÃO 2.314/2022 DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA E A LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS – LGPD

Tomás Meireles Cardoso

19/12/2022

Neste ano de 2022, foi publicada a Resolução CFM nº 2.314/2022 (“Resolução”), com efeitos imediatos, que regulamenta a prática da telemedicina no Brasil e substitui a última norma do Conselho Federal de Medicina que abordava o tema, a Resolução CFM nº 1643/2002, naturalmente defasada pelo tempo e pelo avanço tecnológico significativo ocorrido nesses últimos 20 anos. A resolução do ano de 2002 era anterior a muitas das tecnologias corriqueiras que existem atualmente, como a internet 4G, o smartphone, o uso de inteligência artificial, a internet das coisas e a potencialização do processamento de dados em larga escala.
Em suas considerações iniciais, a resolução menciona leis como a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018) e o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) e dentre tantos aspectos que poderíamos destacar, um ponto vem à tona: os reflexos na escolha da base legal pelos agentes de tratamento.
A partir do início do ano de 2020, com urgência devido à pandemia, a telemedicina galopou de um recurso opcional para um meio essencial, forçando o Conselho Federal de Medicina a se manifestar, o que foi feito por meio do Ofício CFM n° 1.756/2020, em que se reconheceu a possibilidade e a eticidade da utilização da telemedicina para garantir o acesso à saúde, durante o período de isolamento. O Ofício CFM n° 1.756/2020 definiu ainda as modalidades teleorientação, telemonitoramento e teleinterconsulta, mas nada foi acrescido no sentido de estabelecer a necessidade do consentimento do paciente para a telemedicina.
Além disso, se o paciente não estiver de acordo com a consulta, nos parece que, no caso da telemedicina, em algumas modalidades, bastaria o paciente se manifestar de forma contrária e, a depender, apenas desligar o dispositivo. A simplificação do consentimento para condutas mais simples, uma vez que se a pessoa se apresenta para uma consulta médica, admite-se que está de acordo com a consulta.
A LGPD, lei considerada específica sob a proteção de dados pessoais no Brasil, abriu um leque de bases legais, criando alternativas e dispensando o necessário consentimento do titular dos dados pessoais, no caso, o paciente, incluindo aí a hipótese da tutela da saúde [artigo 11°, II, “f”], podendo essa justificativa ser usada por profissionais e serviços de saúde, o que dispensaria o consentimento.
“Art. 11. O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer nas seguintes hipóteses: […] II – sem fornecimento de consentimento do titular, nas hipóteses em que for indispensável para: […] f) tutela da saúde, exclusivamente, em procedimento realizado por profissionais de saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária.”
Com efeito, a nova normativa contempla a privacidade e a proteção de dados como valores importantes que devem ser resguardados pela regulação da telemedicina. O artigo 15º, da Resolução CFM 2.314/2022, deixa expresso que o paciente ou seu representante legal deverá autorizar o atendimento por telemedicina e a transmissão das suas imagens e dados por meio de (termo de concordância e autorização) consentimento, livre e esclarecido, enviado por meios eletrônicos ou de gravação de leitura do texto com a concordância, devendo fazer parte do SRES (sistema de registro eletrônico de saúde) do paciente.
O parágrafo único vem ainda ressaltar que em todo atendimento por telemedicina deve ser assegurado consentimento explícito, no qual o paciente ou seu representante legal deve estar consciente de que suas informações pessoais podem ser compartilhadas e sobre o seu direito de negar permissão para isso, salvo em emergência médica.
Esta resolução destaca também a importância do atendimento presencial, mas traz como mudança a possibilidade de realização de consultas online sem a preexistência de relacionamento com o paciente. Como forma de estimular o atendimento presencial, a Resolução dispõe que a contraprestação financeira devida ao médico pelo atendimento por telemedicina deve seguir o mesmo padrão da contraprestação paga pelo atendimento presencial.
Além disso, a Resolução ressalta dois aspectos centrais dos atendimentos por telemedicina, quais sejam: (a) a liberdade do médico e do paciente para escolher atendimentos presenciais ou online e a necessidade de consentimento livre e esclarecido do paciente e (b) a proteção e segurança dos dados do prontuário ao utilizar um Sistema de Registro Eletrônico de Saúde (SRES), devendo este atender integralmente padrões de segurança legalmente aceitos, como o padrão ICP-Brasil.
O médico deverá obrigatoriamente possuir assinatura digital qualificada, padrão ICP-Brasil, e qualquer documento emitido no contexto de atendimentos remotos deverá constar em prontuário e observar as normas vigentes sobre proteção e dados e prontuário médico.
A Resolução ainda esclarece que a telemedicina não se restringe a teleconsulta, mas abrange vários outros tipos de comunicação remota, desde a realização de laudos e diagnósticos à distância, até a realização de teletriagem, hipótese na qual o médico avalia os sintomas do paciente à distância com a finalidade de encaminhá-lo para regulação ambulatorial ou hospitalar. Neste caso, o estabelecimento responsável pela teletriagem deverá oferecer e garantir o sistema de regulação para encaminhamento dos pacientes.
Por fim, empresas que prestem serviços de telemedicina, plataformas de comunicação e arquivamento de dados deverão estar estabelecidas em território nacional e estar inscritas no Conselho Regional de Medicina no estado onde estão sediadas, com responsável técnico com especialidade registrada no mesmo conselho.
Em conclusão, temos que a Resolução CFM 2.314, de 20 de abril de 2022, nova regulação do Conselho Federal de Medicina sobre a telemedicina, dentre os seus efeitos, refletiu na escolha da base legal dentre as previstas na LGPD, ficando reservada a faculdade ao CFM emitir outras normas de telemedicina para situações determinadas que necessitem de regulamentação específica.

Escrito por: Tomás Meireles Cardoso | OAB/SC 59.969A | OAB/RJ 174.452

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