Princípio da precaução
O princípio da precaução e a presunção de legitimidade de um relatório ambiental que embasa ação civil pública são suficientes para barrar obras civis numa área de preservação permanente (APP), se estas não foram autorizadas por nenhum órgão ambiental. Afinal, não raras vezes, o dano à natureza é irreversível e de difícil reparação, podendo comprometer o futuro de muitas gerações.
Com este entendimento, a 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve liminar que impediu a continuidade das obras de drenagem num banhado localizado em área protegida sem a devida licença do órgão ambiental estadual. Com a manutenção da decisão, o proprietário rural deve se abster de novas intervenções na área, de 1,8 hectare, não podendo cultivar o solo nem fazer pecuária sem autorização, sob pena de multa de R$ 5 mil em caso de desobediência.
O relator do agravo de instrumento no colegiado, desembargador Miguel Ângelo da Silva, disse que os drenos foram instalados em área com grande incidência de água. Esta, por sua vez, segundo o relatório do 4º Grupo da Polícia Ambiental, se origina de nascentes (vertentes), formando uma área típica desse ecossistema. A seu ver, a constatação in loco da situação de potencial dano é prova documental idônea da intervenção indevida em banhado, área protegida.
Nesse cenário, segundo o relator, impõe-se providências para resguardo da preservação ambiental. ‘‘Esse entendimento põe-se conforme os princípios constitucionais que colimam a preservação do Meio Ambiente, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, à luz do que preceitua o artigo 225 da Constituição Federal, porquanto tal constitui não só um dever do Poder Público, mas também da coletividade’’, destacou.
Área em risco
O caso chegou à Justiça depois que o Ministério Público constatou, por meio de relatório produzido pelo 4º Grupo de Polícia Ambiental, que o agricultor estava abrindo valas e colocando tubos de concreto naquela área de APP, com o objetivo de secar o banhado. As obras, no entanto, não tinham licença ambiental, motivando o MP a ajuizar ação civil pública, com pedido de liminar, para fazer cessar os possíveis danos.
De acordo com o artigo 3º, inciso II, do Código Florestal (Lei 12.651/2012), APP é a área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
A juíza Lilian Raquel Bozza, da Vara Judicial de Tapejara, viu ‘‘razoabilidade’’ no pedido do MP, deferindo a tutela de urgência para evitar o agravamento dos danos na área. O juízo ainda vai julgar o mérito da ACP.
Agravo de instrumento
Em combate ao despacho judicial, o ruralista interpôs Agravo de Instrumento no Tribunal de Justiça, explicando que a intervenção em 1,8 hectare restringe-se à limpeza de alguns metros de valas que lá existem desde os tempos da escravatura. Alegou que não pode ficar impedido de plantar ou criar na área até que a questão se resolva judicialmente; ou seja, tem de ser observado o periculum in mora inverso.
Além disso, assegurou que sempre utilizou esta pequena fração de terra para pastoreio do gado bovino e o cultivo de aveia. Logo, não comporta isolamento, pois isso inviabilizaria a utilização do restante da propriedade rural.
Afirmou que, a persistir a decisão agravada, terá de isolar a área, impedindo o acesso dos animais à água. Entretanto, ponderou que não é possível fazer cercas do dia para a noite. Por fim, invocou a aplicação do princípio da insignificância em delitos ambientais.
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Processo 70077922839.
Fonte: ConJur – Por Jomar Martins