Prisão Imediata Após Condenação pelo Tribunal do Júri

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Prisão Imediata Após Condenação pelo Tribunal do Júri

Vinicius Demarchi

27/09/2024

O Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, decidiu que a soberania das decisões do Tribunal
do Júri, garantida pela Constituição Federal, justifica a execução imediata da pena imposta.
Assim, condenados pelo júri popular podem ser presos imediatamente após a decisão. Esse
entendimento foi consolidado no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1235340, em
12/09/2024, e possui repercussão geral (Tema 1068), ou seja, deve ser aplicado em todos os
casos semelhantes.

A decisão gerou grande polêmica, especialmente por envolver direitos fundamentais. A
Constituição Federal, em seu art. 60, §4°, trata esses direitos como cláusulas pétreas, ou seja,
garantias que não podem ser modificadas nem mesmo por Proposta de Emenda à Constituição
(PEC). Dois desses direitos são diretamente afetados pela decisão do STF: a presunção de
inocência (art. 5º, inciso LVII) e o duplo grau de jurisdição (art. 5º, inciso LV).
A presunção de inocência assegura que ninguém pode ser considerado culpado antes de uma
sentença condenatória definitiva, ou seja, após o trânsito em julgado, quando não há mais
possibilidade de recurso. Já o duplo grau de jurisdição garante a possibilidade de revisão de uma
decisão judicial desfavorável, sem distinção entre decisões de juízes togados e do Tribunal do
Júri.

Dessa forma, tais direitos impedem a execução imediata das condenações do Tribunal do Júri,
salvo em casos em que a prisão preventiva é justificada conforme o art. 312 do Código de
Processo Penal (CPP). Além disso, a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São
José da Costa Rica), em seu art. 8.2.h, reforça que toda pessoa acusada de delito tem direito à
presunção de inocência até que sua culpa seja comprovada, além do direito de recorrer da
sentença para uma instância superior.

Importante lembrar que o próprio STF, em decisão de 07/11/2019, nas Ações Diretas de
Constitucionalidade (ADCs) 43, 44 e 54, alterou entendimento anterior e passou a reconhecer a
impossibilidade de prisão imediata após condenação criminal, com base justamente na
presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII CF), conforme o artigo 283 do CPP.
Os ministros que apoiaram a nova tese fixada no Tema 1068 argumentaram que a competência
do Tribunal do Júri para julgar crimes dolosos contra a vida (art. 5º, inciso XXXVIII, ‘d’) e a
soberania dos veredictos (art. 5º, inciso XXXVIII, ‘c’) impedem que tribunais substituam a decisão
do júri popular. Portanto, a execução da pena, mesmo sem o julgamento de apelação, não
violaria o princípio da presunção de inocência.

Na prática, a partir desse julgamento, todas as pessoas condenadas pelo Tribunal do Júri poderão
ser presas imediatamente, independentemente da pena aplicada. Isso gera situações
paradoxais: por exemplo, uma pessoa condenada por estupro com morte (art. 213, §2° do
Código Penal) por um juiz togado a 15 anos de reclusão pode aguardar o julgamento de recursos
em liberdade. Já uma pessoa condenada por homicídio simples (art. 121, caput do Código Penal)
a 6 anos de prisão pelo júri poderá ser presa imediatamente, mesmo que recorra da decisão.
Essa decisão também levanta a questão da isonomia, prevista no caput do art. 5º da
Constituição, que assegura que todos são iguais perante a lei. Além disso, amplia, em prejuízo
do réu, as hipóteses de prisão imediata. O Pacote Anticrime de 2019 já havia introduzido, no art.
492, inciso I, alínea ‘e’, do CPP, a possibilidade de prisão imediata para condenações do Tribunal
do Júri com penas iguais ou superiores a 15 anos de reclusão. Agora, todos os condenados pelo
júri poderão ser presos, independentemente da pena imposta.


Fica a dúvida: os tribunais irão manter em liberdade aqueles que foram condenados pelo
Tribunal do Júri, mas que recorrem em liberdade, respeitando a proibição da retroatividade
prejudicial (art. 5º, XL da Constituição), ou aplicarão a nova orientação do STF?

A insegurança jurídica é evidente, pois o STF não abordou como tratar os casos de condenados
pelo júri que estão em liberdade enquanto recorrem. Isso deixa a decisão a critério dos juízes
presidentes dos Tribunais do Júri ou dos Tribunais de Justiça que estão analisando os recursos.
Podemos esperar decisões conflitantes, com alguns juízes ordenando a prisão imediata e outros
mantendo a liberdade com base na irretroatividade da lei penal prejudicial.

Agora, resta aguardar os desdobramentos.

Por: Vinicius Demarchi – Advoagdo OAB/SC 44.981 | Bertol Sociedade de Advogados

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