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Escrito por Bertol Sociedade de Advogados
Hoje, 4 de junho, é o Dia Internacional das Crianças Vítimas de Agressão. A data foi definida pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1982, com o objetivo de alertar a sociedade sobre os efeitos dos diversos tipos de violência a que muitas crianças estão submetidas.
De acordo com especialistas, a maneira mais eficiente de combater a violência contra crianças é por meio de denúncias e elas podem ser feitas pelo Disque 100. O serviço é uma espécie de “pronto socorro” dos direitos fundamentais porque atende também violações que acabaram de ocorrer ou que ainda estão em curso e aciona os órgãos competentes, com a possibilidade de promover o flagrante. Das denúncias registradas no Disque 100 em 2019, 55% delas envolviam crianças ou adolescentes. Foram 86.837 chamadas deste tipo – 3.194 delas em Santa Catarina. Negligência, violência psicológica, física, sexual, institucional e exploração do trabalho são as principais violações.
Nos meses de março, abril e maio de 2020, o PJSC registrou o ingresso de 585 ações relativas a estupro de vulnerável, o que significa mais de seis por dia, inclusive aos sábados e domingos. Um aumento de 62% em comparação com o mesmo período do ano anterior. O crime é caracterizado quando um adulto tem conjunção carnal ou pratica ato libidinoso com menor de 14 anos.
Conforme alguns estudos, a estimativa de subnotificação nestes casos é igualmente impressionante: apenas 10% dos delitos sexuais são notificados. Por isso é importante conhecer os caminhos para proteger a vítima e denunciar o agressor. Apesar dos números trágicos, o Brasil tem uma legislação de proteção à infância muito avançada.
A revolução do ECA
Pode parecer estranho, mas antes da entrada em vigor do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, as pessoas com menos de 18 anos no Brasil não eram consideradas “sujeitos com direitos”, mas apenas objeto de medidas judiciais. A legislação anterior, o Código de Menores, não valia para todos, só para aqueles que estavam em “situação irregular” e também não fazia distinção entre os que haviam sofrido alguma violação e os que tinham cometido algum ato infracional. Aliás, a lei não fazia distinção entre crianças e adolescentes – todos eram chamados de “menores”.
O ECA rompe com a Doutrina da Situação Irregular, implementa o princípio da Proteção Integral e traz, para o campo da infância e juventude, os direitos humanos já reconhecidos para os maiores de 18 anos desde 1948. A doutrina da proteção integral é direcionada a todas as crianças e adolescentes e se constitui, segundo a juíza Ana Cristina Borba Alves, da Vara da Infância e Juventude da comarca de São José, “em um programa de ação que assegura, com absoluta prioridade, os direitos individuais e as garantias fundamentais inerentes à criança e ao adolescente, enquanto sujeitos de direito”. Ou seja, cidadãos que merecem proteção especial.
O Estatuto define que crianças e adolescentes têm prioridade absoluta para receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, no atendimento de serviços públicos, na formulação e na execução de políticas públicas e na destinação de recursos. O Estatuto convoca a família, a sociedade e o Estado para atuarem de forma conjunta na defesa da infância e juventude. O Estatuto criou o Conselho Tutelar.
Para a juíza Brigitte Remor de Souza May, da comarca da Capital, “o Estatuto é tão importante que outras legislações posteriores vieram na mesma linha, como o Estatuto do Idoso, a Lei Maria da Penha, o Estatuto da Juventude etc”.
Canais de Denúncia
O ECA, em seu artigo 5º, determina que “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. O Estatuto especifica e detalha as diferentes formas de violência.
Além do “Disque 100”, há outros caminhos para se fazer uma denúncia. Em Santa Catarina, por exemplo, há 31 delegacias especializadas em proteção à criança, ao adolescente, à mulher e ao idoso (DPCAMI), mas não é necessário ir até uma delas. A Policia Civil disponibiliza o 181, disque-denúncia que funciona 24 horas por dia e garante o anonimato do denunciante – as ligações não são rastreadas. De forma remota é possível fazer a denúncia através do WhatsApp, pelo número (48) 98844-0011, ou pela Delegacia Virtual, na qual é possível registrar Boletim de Ocorrência sem sair de casa. Para situações de emergência, a Polícia Militar pode ser contactada pelo 190. A corporação tem o Aplicativo PMSC Cidadão.
É possível ainda acionar o Ministério Público, que recebe e dá encaminhamento a denúncias que envolvem fatos praticados por órgãos e agentes, públicos e privados. O melhor e mais rápido meio é pelo formulário, disponibilizado no site da instituição.
Por fim, o Estatuto da Criança e do Adolescente estipulou a criação do Conselho Tutelar, órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente no âmbito municipal. O Conselho faz com que a família, sociedade e governo assumam a responsabilidade de respeitar os direitos garantidos no ECA.
Especialistas ressaltam que a escola é uma grande aliada no combate a este tipo de violência. “Professores, coordenadores e diretores são parceiros fundamentais nesta luta. A maioria dos abusos contra crianças, que chegou a mim nestas duas décadas de profissão, foi descoberta pela escola”, afirma a juíza Ana Cristina Borba Alves.
O artigo 70 do ECA estabelece que é “dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente” e o artigo 245 determina que médicos, professores ou responsáveis por estabelecimentos de saúde ou de educação são obrigados a comunicar à autoridade competente os casos de que tenham conhecimento, como suspeitas ou confirmação de maus-tratos.
De acordo com a desembargadora Rosane Portela Wolff, à frente da Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude (Ceij), a data reforça a necessidade de trazer à discussão a problemática da violência contra crianças e adolescentes, em todas as suas formas, quando se sabe que os números de notificações são apenas a ponta do iceberg das violências cotidianas que efetivamente acontecem – um número muito maior nunca chega à luz pública. “A sociedade como um todo precisa voltar os olhos para essa questão, porquanto crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, seres em desenvolvimento, e, como tal, merecem proteção jurídica e políticas públicas que possam efetivamente proteger, prevenir e combater essas violências”, afirma.
Conteúdo: Assessoria de Imprensa/NCI | Responsável: Ângelo Medeiros – Reg. Prof.: SC00445(JP)
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