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Escrito por Bertol Sociedade de Advogados
Na expressão “ato libidinoso” descrita no tipo do artigo 217-A do Código Penal estão contidos todos os atos de natureza sexual, diversos da conjunção carnal, que tenham a finalidade de satisfazer a libido do agente.
Com base neste entendimento, o ministro Jorge Mussi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acolheu os argumentos formulados pelo Ministério Público do Estado (MPSC) e anulou acórdão do Tribunal de Justiça do Estado (TJSC) que desclassificou crime de estupro de vulnerável para importunação sexual envolvendo uma criança de sete anos de idade.
Com a decisão do magistrado, foi restabelecida a pena imposta em primeira instância, de 13 anos e quatro meses de reclusão (em grau de apelação, o Tribunal catarinense havia aplicado ao réu a pena de um ano e 8 meses de reclusão, sob regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos – limitação de final de semana e prestação pecuniária de 3 (três) salários mínimos).
De acordo com os autos, o réu foi denunciado pelo crime de estupro de vulnerável (art. 217-A, caput, na forma do art. 71, ambos do Código Penal), sob a acusação de ter praticado atos libidinosos diversos da conjunção carnal com uma menina que à época dos fatos contava com apenas 7 (sete) anos de idade –, “consistentes em, por cima das vestes, passar a mão na vagina da criança, segurá-la pelos braços e fazer com que ela encostasse em seu pênis”.
Após a condenação em primeira instância, o réu apelou ao TJSC, que desclassificou o crime e reduziu drasticamente a pena imposta. Em seu voto, o relator da apelação criminal anotou:
“[…] Repisa-se, conquanto essa atitude não seja irrelevante, especialmente porque praticada contra uma criança, o comportamento não pode ser comparado ao de alguém que praticou atos mais invasivos, como passadas de mão pelo corpo por baixo das vestimentas, a cópula anal, oral ou vaginal. O que se está dizendo é que é objetivamente desigual a ação praticada pelo Apelante e o coito consumado, o sexo oral ou a introdução de objetos no seu aparelho genital, reclamando estes últimos maior apenamento. Salvo melhor compreensão, não pode o Recorrente ser prejudicado pela atecnia do Legislador que, ao deixar de diferenciar atos libidinosos por graus de ofensividade, não prestigiou o princípio constitucional da proporcionalidade. Não atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade conceber que cópula vagínica, sexo anal, oral, ou a masturbação, e um abraço e beijo ofendam na mesma intensidade ao bem jurídico tutelado e prevejam apenamento idêntico quando, em verdade, constituem condutas diversas, cuja lesividade (desvalor da ação e do resultado) não pode ser equiparada. Nesse sentido, esta Câmara já se pronunciou pela possibilidade de aplicação retroativa do art. 215-A do Código Penal em caso em que se apurava a prática de crime de estupro de vulnerável”.
No recurso ao STJ, o Ministério Público sustentou que as condutas praticadas pelo acusado “subsumem-se ao tipo penal do crime de estupro de vulnerável, o que afasta a possibilidade de desclassificação da conduta para o delito de importunação sexual”.
Alega que a conduta imputada ao réu, por si só, preenche o tipo penal de estupro com violência presumida, o qual dispensa a prática de conjunção carnal, sexo anal ou oral, porquanto suficiente a prática de ato libidinoso, diverso da conjunção carnal, destinado à satisfação da lascívia do acusado.
Ao analisar os argumentos, o ministro Jorge Mussi, ex-presidente do TJSC, deu razão ao representante do MPSC. Para o magistrado, o acórdão da corte catarinense “destoa da jurisprudência” do STJ.
Assinala Mussi em sua decisão:
“No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, pacificou-se o entendimento de que ‘o ato libidinoso diverso da conjunção carnal, que, ao lado desta, caracteriza o crime de estupro, inclui toda ação atentatória contra o pudor praticada com o propósito lascivo, seja sucedâneo da conjunção carnal ou não, evidenciando-se com o contato físico entre o agente e a vítima durante o apontado ato voluptuoso’ (AgRg REsp n. 1.154.806/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA Turma, DJe 21/3/2012).
Além deste argumento, o ministro ainda acrescentou que “prevalece também na jurisprudência desta Corte Superior o entendimento de que ‘não cabe ao órgão julgador, sob pretexto de desproporcionalidade entre a conduta e o preceito normativo secundário, desclassificar o fato imputado para uma infração penal considerada mais branda, visto que a gravidade da conduta deve incidir na culpabilidade do agente, para fins de dosimetria da pena, e não servir de instrumento dissimulador da tipificação do ato’”.
“Assim, devidamente caracterizada a conduta descrita no art. 217-A do Código Penal, mediante o contato físico entre agressor e vítima e a violência presumida – constranger a menor de 7 (sete) anos de idade, passando a mão na sua vagina –, impõe-se o afastamento da desclassificação promovida pelo Tribunal de origem, devendo ser observado o princípio da especialidade e a violência presumida”, finaliza o ministro, dando provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença condenatória.
O processo estão sob segredo de Justiça
Fonte: JusCatarina
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