Na desapropriação, conforme previsto pela Constituição Federal no inciso XXIV do artigo 5º, a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos na Constituição.
A legislação que regula a desapropriação é o Decreto-Lei 3365/41, o qual estabelece, em seu artigo 20, que “A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.” Portanto, dentro da própria ação de desapropriação, não é possível discutir questões relacionadas a eventuais desvios de finalidade por parte do administrador público.
Desvio de Finalidade na Desapropriação
O desvio de finalidade ocorre quando o administrador público, embora detentor da competência para realizar determinado ato, age em desacordo com a finalidade estabelecida, dando ao bem expropriado uma destinação distinta daquela prometida no decreto expropriatório. Isso pode configurar uma violação dos princípios constitucionais da administração pública, como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
No entanto, há situações em que uma mudança na destinação do bem expropriado pode ser considerada lícita, desde que atenda ao interesse coletivo e suprima a supremacia do interesse público. Por exemplo, se o administrador desapropria um imóvel com o intuito de construir um hospital, mas posteriormente decide que é mais necessário construir uma escola ou creche, essa alteração, chamada de tredestinação, continua a atender aos interesses da coletividade.
Por outro lado, a destinação do bem expropriado será considerada ilícita se for contra os princípios constitucionais ou se não atender aos critérios de necessidade ou utilidade pública. Um exemplo de desvio de finalidade ilícito seria ceder o imóvel desapropriado para uma pessoa privada construir um hotel, pois isso não atende ao interesse público previsto inicialmente.
Ações para Questionar o Desvio de Finalidade
Questões relacionadas ao desvio de finalidade podem ser levantadas por meio de uma ação autônoma, como a Ação Anulatória de Ato Administrativo, que tramita pelo Rito Comum e permite uma instrução processual mais detalhada. Nesta ação, é possível solicitar a suspensão da ação de desapropriação por meio de tutela antecipada (liminar), desde que sejam atendidos os requisitos de fumus boni juris (fumaça do bom direito) e periculum in mora (perigo na demora).
Procedimento de Desapropriação
O procedimento de desapropriação envolve o ato pelo qual o Estado toma para si ou transfere a terceiros bens de particulares, mediante o pagamento de justa e prévia indenização. O poder público deve notificar o proprietário e apresentar uma oferta de indenização, incluindo:
- Cópia do ato de declaração de utilidade pública;
- Planta ou descrição dos bens e suas confrontações;
- Valor da oferta;
- Informação de que o prazo para aceitar ou rejeitar a oferta é de 15 (quinze) dias, sendo o silêncio considerado como rejeição.
Indenização na Desapropriação
A indenização deve ser justa, prévia e em dinheiro, conforme exige a Constituição Federal no artigo 5º, inciso XXIV. Uma indenização justa é aquela que recompõe integralmente o patrimônio da pessoa desapropriada, reparando todos os prejuízos sofridos devido à transferência compulsória do bem para o Poder Público.
Caso a indenização não seja justa, prévia ou em dinheiro, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a seguinte tese no Tema 1019: “O prazo prescricional aplicável à desapropriação indireta, na hipótese em que o poder público tenha realizado obras no local ou atribuído natureza de utilidade pública ou de interesse social ao imóvel, é de dez anos, conforme parágrafo único do artigo 1.238 do Código Civil.”
Avaliação dos Bens
Ao despachar a inicial da ação de desapropriação, o juiz designará um perito de sua livre escolha, preferencialmente técnico, para proceder à avaliação dos bens. O perito pode utilizar o método comparativo de dados de mercado para apuração da indenização, método este regulado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e amplamente aceito pela jurisprudência.
Por: Claudia Suman – Advogada OAB/SP 170,915; OAB/SC 69327-e | Bertol Sociedade de Advogados