Afastamento da incidência do ITR sobre as áreas de reserva legal e de preservação permanente

Nos últimos anos muitos contribuintes, proprietários de imóveis rurais, têm sofrido autuações da Receita Federal do Brasil, exigindo a cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR sobre Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal.

O que têm ocorrido é que os contribuintes na Declaração do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – DITR informam a existência das referidas áreas e, posteriormente, a Receita Federal intima os proprietários dos imóveis rurais exigindo a comprovação da existência das áreas. Entretanto, devido a localidade dos imóveis rurais, muitas vezes os contribuintes acabam por não receber a intimação para apresentação da documentação comprobatória, ocorrendo então a intimação por edital. Por sua vez, a intimação por edital acaba não chegando ao conhecimento dos contribuintes, o que acarreta na lavratura de autos de infração exigindo os valores de ITR sobre as Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal.

Ainda, em muitas oportunidades a Receita Federal não se dá por satisfeita com a comprovação feita pelos contribuintes, lançando então a cobrança do ITR sobre a área total do imóvel.

Entretanto, a legislação (artigo 10 da Lei 9.393/96) é clara ao prever a isenção do ITR sobre as áreas de preservação permanente e de reserva legal. Neste sentido, o TRF4, STJ e CARF já possuem entendimento pacificado de que é desnecessária a apresentação de alguns documentos que a Receita Federal tem exigido para a isenção.

Neste sentido, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, editou a Súmula nº 122 que trata da averbação da Área de Reserva Legal para fins de isenção do ITR, com a seguinte redação: “A averbação da Área de Reserva Legal (ARL) na matrícula do imóvel em data anterior ao fato gerador supre a eventual falta de apresentação do Ato declaratório Ambiental (ADA).”

O mesmo entendimento também restou fixado pelo TRF4 na Súmula 86/TRF4: “É desnecessária a apresentação de Ato Declaratório Ambiental – ADA para o reconhecimento do direito à isenção de Imposto Territorial Rural – ITR. Todavia, para o gozo da isenção do ITR no caso de área de “reserva legal”, é imprescindível a averbação da referida área na matrícula do imóvel.”

Quanto a Área de Preservação Permanente, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do EResp nº 1.027.051/SC pacificou o entendimento de que é desnecessária a averbação da Área de Preservação Permanente no registro de imóveis como condição para a concessão de isenção do ITR, pois essa área é delimitada a olho nu.

Entretanto, embora o entendimento pacífico do STJ e do TRF4 seja de que a área de preservação permanente, comprovadamente existente, independe do Ato Declaratório Ambiental para que seja excluída da base de cálculo do ITR, a Receita Federal, por vezes, insiste em exigir o referido documento e, se não entregue, lança a cobrança do ITR sobre a área isenta.

A divergência entre o entendimento do órgão fazendário e do Poder Judiciário acabada levando os proprietários de imóveis rurais a recorrer ao Judiciário, visando que seja reconhecida a isenção do ITR sobre as Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal de seus imóveis e, consequentemente, a anulação das autuações lavradas pela Receita Federal.

Também se tem observado a ocorrência de vícios por parte do órgão fazendário no tocante ao arbitramento do Valor da Terra Nua (VTN), base de cálculo do ITR, tendo em vista a inobservância do mecanismo legal de arbitramento previsto na legislação. O que ocorre é que, por vezes, o agente fiscal lança a cobrança, mas não apresenta quais seriam os valores extraídos do Sistema de Preços de Terra (SIPT) utilizados no cálculo do valor do imóvel, que, por sua vez, é utilizado para cálculo do ITR.

Essa falta de informações detalhadas acerca do cálculo do Valor da Terra Nua efetuada pela fiscalização, caracteriza latente prejuízo ao contraditório e à ampla defesa do contribuinte, que sequer tem conhecimento do enquadramento que foi dado ao imóvel para chegar-se ao valor do imóvel arbitrado.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região[1] também já decidiu que os valores de ITR lançados de ofício pelo Fisco podem ser anulados, quando constatado equívoco das informações relativas ao valor da terra nua de que se valeu a autoridade tributária para cobrança do ITR.

Por fim, ainda se tem observado uma quantidade relevante de notificações fiscais com cobrança de valores de ITR já atingidos pela decadência, eis que, decorridos mais de cinco anos desde o fato gerador. O que acaba ocorrendo é que a Receita Federal realiza a fiscalização do ITR próximo de expirar o prazo de cinco anos, de forma que, até que ocorre a efetiva intimação do contribuinte acerca dos valores lançados, seja por intimação pessoal ou por edital, já extrapolou o prazo decadencial. Assim, o lançamento efetuado acaba por possuir mais um vício, que pode ser arguido pelo contribuinte visando que seja afastada a cobrança.

A insatisfação dos contribuintes com a carga tributária brasileira não é uma novidade. O inconformismo com a carga tributária, somado à cobrança de valores indevidos por parte do órgão fazendário, acaba agravando ainda mais a insatisfação dos contribuintes que, cada vez mais, têm buscado por diversos meios fazer valer seus direitos, seja pela esfera administrativa ou pela judicial. A expectativa que existe hoje é de um aumento da carga tributária com o avanço da reforma, de forma que, cada vez mais, deve-se ficar atento aos lançamentos tributários.

Por: João Paulo Schlögl – Advogado OAB/SC 43.728 | Bertol Sociedade de Advogados


[1] TRF4 5016483-80.2019.4.04.9999, SEGUNDA TURMA, Relator ROBERTO FERNANDES JÚNIOR, juntado aos autos em 15/06/2021